Do pátio de casa, idosa recebe festa surpresa para celebrar aniversário de 100 anos

Quem, na tarde desta segunda-feira (8), passou pelos arredores do número 380 da Rua São Marcos, no bairro Bom Jesus, em Porto Alegre, percebeu a movimentação diferente que ali se formava. Com carro de som, balões e familiares reunidos na calçada, a via foi transformada em um salão de festas para celebrar os cem anos de vida de Jovina de Abreu Enes dos Santos, matriarca da família originária de Butiá, na Região Carbonífera.

 

Isolada desde o início da pandemia de covid-19, ela acompanhou a surpresa dos filhos, netos e bisnetos a partir do pátio da residência da filha Eva Marisa dos Santos Oliveira, 64 anos – onde tem passado os dias de quarentena. A idosa, que mantém grande parte do contato com o restante dos familiares apenas por videochamadas no celular, chegou a pensar que a celebração de seus cem anos passaria em branco, devido ao contexto desfavorável para comemorações.

 

Com os tradicionais abraços calorosos de todo aniversário substituídos por acenos e declarações a distância, a festa na calçada surpreendeu e emocionou a centenária dona Jovina – que acreditava já ter vivido de tudo.

 

— A festa estava muito boa e bonita, que nem a dona. Me cantaram os parabéns e a música “beijinho doce”. Veio todo mundo, muita gente, e deu para matar a saudade de todos. Só os que não vieram foram os tataranetos, que já tenho uns seis ou sete, agora não sei dizer. Mas bisnetos sei que são 15 — conta a aniversariante.

 

Festa adequada ao novo normal

 

A ideia de promover a comemoração diferente partiu das netas Patrícia dos Santos, 39 anos, e Veronica dos Santos Oliveira, 36 anos. As duas, que já vinham planejando havia algum tempo a festa de cem anos da vó, foram pegas de surpresa pelo contexto da pandemia e as medidas necessárias para sua contenção.

 

— Nossa ideia era fazer um festão, mas, com tudo isso, não deu. Decidimos fazer a homenagem na rua, pensando em nos aproximarmos dela nesta data, para não deixar que passasse em branco — conta Patrícia.

 

O jeito, então, foi adequar a celebração à nova realidade vivenciada por todos – respeitando as determinações de distanciamento social, sem deixar de celebrar a passagem de uma data tão marcante para a vó.

 

— Procuramos não convidar muitas pessoas para não causar aglomeração. Então, quem participou é quem sempre esteve mais próximo, como filhos e alguns netos e bisnetos — explica Veronica, garantindo que a festança oficial não foi descartada e deve ser feita quando a situação permitir.

 

Descrita por todos da família como uma pessoa faceira e cheia de energia, no auge de seu século vivido, dona Jovina deixa registrado que, apesar da alegria em receber a homenagem da sacada, não vai abrir mão de um bom arrasta-pé em comemoração aos cem anos completados na segunda. Dessa vez, com bastante contato físico – nem que seja para celebrar os 101, no ano seguinte:

 

— Chegar aos cem não é para qualquer um, cheguei porque Deus quis que eu chegasse. Se ele permitir, chego aos 101.

 

Lembranças do passado se misturam ao presente

 

Entre as antigas lembranças da infância de dona Jovina, estão os relatos feitos pelos pais e avós a respeito de uma época em que todo o mundo também precisou ficar em casa. Nascida em 1920, ela lembra das histórias que ouviu, ainda criança, a respeito da pandemia da gripe espanhola, que teve seu auge nos anos de 1918 e 1919.

 

Hoje, quando o planeta enfrenta novamente uma doença ainda desconhecida, a saudade de estar perto de quem ama é o que mais aperta o peito da idosa centenária.

 

— No início, ela perguntava se era uma guerra, depois entendeu do que se tratava. Às vezes ela esquece, mas, quando assiste televisão e vê as notícias, lembra do que a avó contava e vai comentando. Ela está sentindo muito a falta das pessoas, porque vivia rodeada de gente. Mas, no geral, está suportando bem e se cuidando bastante, sempre passando seu álcool gel — conta a filha Eva Marisa, que tem cuidado da mãe durante este período.

 

Na rotina do isolamento, a idosa não deixou de lado a prática dos exercícios físicos diários e o hábito da leitura – apesar de não estar conseguindo ler o jornal impresso, que sempre gostou de acompanhar, pois não há quem saia para comprá-lo. Independente e sem qualquer grande problema de saúde, dona Jovina, que mora sozinha, também não vê a hora de poder voltar pra casa – onde, segundo a filha, a idosa não para nem por um instante:

 

— Lá, ela não sossega um minuto. Arranca grama do pátio agachada, lava roupa, sempre com água morna, e faz de tudo. Adora dizer que está “firme na paçoca”. Todo mundo comenta que vai chegar aos 110, e ela dá risada. Às vezes, a gente nem acredita. Não dá nem pra expressar a alegria de vê-la assim.

 

Fonte: Gauchazh