Aos 91 Anos, Japonês Cultiva Cerejeiras No Morro Do Chapéu, Em Nova Lima

Filho de imigrantes japoneses, aos 91 anos Haruji Miura considera que sua família foi muito feliz no Brasil. Em 1913, seus pais desembarcaram do navio

Filho de imigrantes japoneses, aos 91 anos Haruji Miura considera que sua família foi muito feliz no Brasil. Em 1913, seus pais desembarcaram do navio Wakasa Maru, no Porto de Santos (SP), em busca de oportunidades e por aqui decidiram ficar. Em agradecimento ao país que abriu suas portas para milhares de conterrâneos, ele decidiu criar um projeto para presentear os brasileiros. Ao semear mudas da árvore que simboliza o Japão no Morro do Chapéu, condomínio de Nova Lima às margens da BR-040, no sentido Rio de Janeiro, Miura trouxe para Minas o Hanami, como é chamado no Japão a temporada de contemplação das flores. Todos os anos, turistas dos quatro cantos do mundo vão ao país asiático para assistir ao espetáculo da florada, que agora, durante 10 dias, deixa o inverno cor de rosa no Morro do Chapéu. “A minha intenção é levar a cerejeira para todos os estados brasileiros”, diz Miura.O criador do Hanami mineiro recebeu a reportagem de Encontro em seu jardim, onde as cerejeiras florescem. Falante, ele anda rapidamente, sobe e desce escadas e aponta a idade de cada uma das árvores que ele mesmo plantou, a partir de mudas que criou com sementes trazidas do Japão. Passar dos 90 anos não impediu que ele continuasse firme e entusiasmado em seu propósito. “Não costumo desistir das boas ideias e as dificuldades me fazem querer persistir”, diz, com um leve sotaque nipônico.Foi assim com as cerejeiras. Quando criou as primeiras mudas, ele passou a distribuí-las aos vizinhos. “Ao receber a doação, as pessoas diziam: ‘vou plantar, Miura’. Mas não plantavam”, lembra. Quando percebeu o risco que sua ideia corria, ele mesmo, com a ajuda de um jardineiro de sua confiança, fez covas de 4 x 4 metros e distribuiu as mudas no entorno do campo de golfe do condomínio. Não falou nada com ninguém e continuou plantando. Com paciência oriental, esperou em silêncio por cerca de seis anos. Um belo dia, quando os frequentadores do campo de golfe chegaram para mais uma partida, as árvores estavam floridas. “Levaram um susto, ficaram bobos”, conta Miura, com o sorriso aberto. A estratégia de impacto foi um recurso que ele usou de forma bem calculada. “Eu percebi que as pessoas só se interessariam pelo plantio depois de verem a florada.” Funcionou.A beleza das árvores fez Miura ganhar amigos e admiradores que, atraídos pela beleza da flor, transformaram sua casa quase em ponto turístico no Morro do Chapéu. Muitos passaram a pedir mudas e, de fato, a plantá-las. Ele já doou milhares a escolas, hospitais, prefeituras e pessoas comuns. Recebe a todos com bom humor e promove até um dia especial para a contemplação das árvores no auge da florada. A distribuição gratuita foi reduzida, porque é com o valor que apura nas vendas que ele consegue parte dos recursos para produzir novas mudas e seguir em frente.Plantar em todo o Brasil não é uma missão fácil, mas em 70% dos estados brasileiros já existe a cerejeira. Mas, Miura não só trouxe a árvore japonesa para cá. Ele também já levou o ipê amarelo para o Japão. A árvore símbolo do Brasil, nativa do cerrado, floresceu em Fukushima, cidade arrasada pelo tsunami. Lá, impressiona os japoneses com sua coloração impactante. “Sou japonês e sou brasileiro. As árvores mostram a amizade entre os dois países.” Miura explica que escolheu plantar a cerejeira por considerar que ela representava bem sua intenção. “Ela simboliza o Japão e tem uma das flores mais bonitas do mundo.” Antes de chegar à árvore cor de rosa, outras tonalidades, como a branca, foram testadas mas não se adaptaram por aqui. Para lidar com a produção de mudas na Miura Cerejeiras, o dono da ideia acorda cedo e não tem problema para curvar-se. “Não gosto de ficar parado.”E você, que está lendo esta reportagem, pode se perguntar de onde vem tanta disposição: ele conta que nunca parou de se movimentar e desconfia que sua saúde pode vir daí. “Não me lembro de ter ficado doente.” Aos 10 anos, o pequeno Haruji já dividia o tempo entre a escola japonesa, erguida por imigrantes em Lins (SP), onde nasceu, as brincadeiras da infância e o trabalho duro na lavoura de café. Adolescente, era entregador do grão. “Carregava os fardos por toda a cidade, a pé, com chuva ou sol.” O trabalho com a família rendeu até ele vir para Minas, onde se aposentou depois de 28 anos na Usiminas. Com essa biografia, Miura agora usufrui de seu tempo livre dedicando-se às árvores, que parecem dividir com ele a vitalidade. “Cerejeira é vida”, diz.

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